quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

"A Vergonha?

"A Vergonha? - crônica de Luiz Fernando Veríssimo sobre o BBB



Que me perdoem os ávidos telespectadores do Big Brother Brasil (BBB), produzido e organizado pela nossa distinta Rede Globo, mas conseguimos

chegar ao fundo do poço. A décima primeira (está indo longe) edição do BBB é

uma síntese do que há de pior na TV brasileira. Chega a ser difícil

encontrar as palavras adequadas para qualificar tamanho atentado à

nossa modesta inteligência.

Dizem que Roma, um dos maiores impérios que o mundo conheceu, teve seu

fim marcado pela depravação dos valores morais do seu povo,

principalmente pela banalização do sexo. O BBB atual é a pura e suprema

banalização do sexo. Impossível assistir ver este programa ao lado dos

filhos.. Gays, lésbicas, heteros, transexuais.. todos na mesma casa, a casa dos

?heróis?, como são chamados por Pedro Bial. Não tenho nada contra

gays, acho que cada um faz da vida o que quer, mas sou contra safadeza

ao vivo na TV, seja entre homossexuais ou heterosexuais e nesta edição, até uma transexual. O BBB atual é a realidade em busca do IBOPE.

Veja como Pedro Bial tratou os participantes do BBB atual. Ele prometeu

um zoológico humano divertido?. Não sei se será divertido, mas parece

bem variado na sua mistura de clichês e figuras típicas.

Se entendi corretamente as apresentações, são bichos ?animais? do

?zoológico?: um gay declarado, mas quando ri e debocha , solta as plumas , o gay afeminado, que adora ficar fazendo caretas e fofocas com o outro, a modelo gostosa, a gordinha sapeca, a loira sapatão, lésbica convicta,a gostosa com cabelo que deve estar cheio de piolhos, > o carioca marrento,que vive se esfregando na namorada boazuda, o baiano gaguinho que adora apertar a vesguinha. Pergunto-me, por exemplo, como um jornalista, documentarista e

escritor como Pedro Bial que, faça-se justiça, cobriu a Queda do Muro

de Berlim, se submete a ser apresentador de um programa desse nível.

Em um e-mail que recebi há pouco tempo, Bial escreve maravilhosamente

bem sobre a perda do humorista Bussunda referindo-se à pena de se

morrer tão cedo. Eu gostaria de perguntar se ele não pensa que esse

programa é a morte da cultura, de valores e princípios, da moral, da

ética e da dignidade.

Outro dia, durante o intervalo de uma programação da Globo, um outro

repórter acéfalo do BBB disse que, para ganhar o prêmio de um milhão e

meio de reais, um Big Brother tem um caminho árduo pela frente,

chamando-os de heróis. Caminho árduo? Heróis? São esses nossos

exemplos de heróis?

Caminho árduo para mim é aquele percorrido por milhões de brasileiros,

profissionais da saúde, professores da rede pública (aliás, todos os

professores), carteiros, lixeiros e tantos outros trabalhadores

incansáveis que, diariamente, passam horas exercendo suas funções com

dedicação, competência e amor e quase sempre são mal remunerados...

Heróis são milhares de brasileiros que sequer tem um prato de comida

por dia e um colchão decente para dormir, e conseguem sobreviver a

isso todo santo dia.

Heróis são crianças e adultos que lutam contra doenças

complicadíssimas porque não tiveram chance de ter uma vida mais

saudável e digna.

Heróis são inúmeras pessoas, entidades sociais e beneficentes, ONGs,

voluntários, igrejas e hospitais que se dedicam ao cuidado de

carentes, doentes e necessitados (vamos lembrar de nossa eterna

heroína Zilda Arns).

Heróis são aqueles que, apesar de ganharem um salário mínimo, pagam

suas contas, restando apenas dezesseis reais para alimentação, como

mostrado em outra reportagem apresentada meses atrás pela própria Rede

Globo.



O Big Brother Brasil não é um programa cultural, nem educativo, não

acrescenta informações e conhecimentos intelectuais aos

telespectadores, nem aos participantes, e não há qualquer outro

estímulo como, por exemplo, o incentivo ao esporte, à música, à

criatividade ou ao ensino de conceitos como valor, ética, trabalho e

moral. São apenas pessoas que se prestam a comer, beber, tomar sol,

fofocar, dormir e agir estupidamente para que, ao final do programa, o

?escolhido? receba um milhão e meio de reais. E ai vem algum psicólogo

de vanguarda e me diz que o BBB ajuda a "entender o comportamento

humano". Ah, tenha dó!!!

Veja o que está por de tra$$$$$$$$$$$$$$$$ do BBB: José Neumani da

Rádio Jovem Pan, fez um cálculo de que se vinte e nove milhões de

pessoas ligarem a cada paredão, com o custo da ligação a trinta

centavos, a Rede Globo e a Telefônica arrecadam oito milhões e

setecentos mil reais. Eu vou repetir: oito milhões e setecentos mil

reais a cada paredão.

Já imaginaram quanto poderia ser feito com essa quantia se fosse

dedicada a programas de inclusão social, moradia, alimentação, ensino

e saúde de muitos brasileiros?

(Poderia ser feito mais de 520 casas populares; ou comprar mais de

5.000 computadores!) (por paredão !!!)

Essas palavras não são de revolta ou protesto, mas de vergonha e

indignação, por ver tamanha aberração ter milhões de telespectadores.

Em vez de assistir ao BBB, que tal ler um livro, um poema de Mário

Quintana ou de Neruda ou qualquer outra coisa..., ir ao cinema...,

estudar... , ouvir boa música..., cuidar das flores e jardins... ,

telefonar para um amigo... , visitar os avós... , pescar..., brincar

com as crianças... , namorar...ir a igreja orar para estes pobres coitados e pecadores que assistem esta porcaria, ou simplesmente dormir. Assistir ao

BBB é ajudar a Globo a ganhar rios de dinheiro e destruir o que ainda

resta dos valores sobre os quais foi construída nossa sociedade.



Luiz Fernando Veríssimo